A qualidade da água dos estados que pertencem à bacia hidrográfica da Mata Atlântica brasileira teve uma sensível melhora de 2022 para 2023. Contudo, neste mesmo período, a quantidade de locais com água considerada péssima aumentou, e 10 dos 16 estados presentes na pesquisa não têm água considerada boa, sendo São Paulo o único estado com resultado péssimo.

As informações são do relatório Observando os Rios 2024, divulgado nesta quinta-feira (21) pela Fundação SOS Mata Atlântica (Sosma), que tem sede em Itu (SP). O estudo retrata a qualidade da água nas bacias hidrográficas da Mata Atlântica e indica a segurança para consumo e uso, como na irrigação.

A divulgação na data ocorre em função da Organização das Nações Unidas (ONU) ter instituído o 22 de março como o Dia Mundial da Água.

 

Água do Rio Tietê em Botucatu é classificada como boa em relatório da SOS Mata Atlântica

A instituição alerta que, apesar da ligeira melhora observada, o quadro de alerta em relação aos rios da Mata Atlântica persiste, o que revela fragilidade na condição ambiental da maioria dos rios monitorados nos estados do bioma.

O g1 elaborou um mapa com base nos dados divulgados pela instituição. Foram considerados os quantitativos por estado. Os pontos mostram a média do índice de qualidade da água analisado nos rios do bioma. Veja abaixo:

mapa 

De acordo com a Sosma, foram realizadas 1.101 análises em 174 pontos de coleta, de 129 rios e corpos d'água, em 80 municípios de 16 estados da Mata Atlântica. Ao menos 130 grupos voluntários participam da ação.

Dos 16 estados analisados e que estão presentes no bioma da Mata Atlântica, somente seis deles apresentam água considerada boa. São eles: Alagoas (9,1%); Paraíba (40%); Rio Grande do Norte (20%); Rio Grande do Sul (12,5%); São Paulo (8,8%) e Sergipe (12,5%).

Os demais estados, conforme as análises, só possuem águas, no máximo, consideradas regulares. Eles são os seguintes: Bahia, Ceará, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e Santa Catarina.

O estudo revela uma informação preocupante: nenhum dos 16 estados com amostras que participaram das coletas e das análises apresentou água considerada ótima.

Ainda conforme o estudo, do total de amostragem, 14 pontos (8%) estão com média de qualidade boa e cinco (2,9%) das águas analisadas foram consideradas de péssima qualidade.

"Percebemos uma tendência de melhora, mas o quadro de alerta em relação aos rios da Mata Atlântica persiste, revelando a fragilidade da condição ambiental de parte significativa dos corpos d'água monitorados. A qualidade regular da água obtida em 77% dos pontos demanda atenção especial dos gestores públicos e da sociedade, especialmente neste momento de emergência climática", comenta Gustavo Veronesi, coordenador do programa Observando os Rios.

 Rios que tiveram melhora

Considerando cada ponto de análise individualmente, a condição da qualidade da água melhorou em 12 pontos e piorou em quatro. No restante, de acordo com o estudo, manteve-se a mesma média de qualidade. A melhora do Rio Mamanguape, na Paraíba, é um dos destaques. O rio saiu da condição média regular para boa.

Conforme a Sosma, o destaque se dá porque essa medição é feita na foz desse rio, porém, o percurso dele passa por enormes áreas de canavial.

Geralmente, isso impacta negativamente na qualidade da água, mas, nesse caso, não foi o que apareceu nos resultados.

O Ribeirão do Curral, em Ilhabela (SP), foi outro destaque positivo do levantamento. Ele saiu da condição regular para boa.

"Obras de coleta e tratamento de esgoto estão em curso neste município, ainda que em ritmo muito aquém do que a população almeja, dado que outros rios monitorados na ilha ficaram com a mesma condição regular, porque ainda faltam estações de tratamento de esgoto", afirma um trecho do levantamento.

O estudo lembra que Guarulhos, segundo município mais populoso do estado de São Paulo e que ainda tem enormes desafios na coleta e tratamento de esgoto doméstico, também teve um destaque positivo no que se refere ao Rio Tietê, que apresentou condição regular na divisa com São Paulo.

Outro ponto de melhora da média da qualidade da água foi no Rio Jundiaí, no município de Salto. Houve registro de melhora também do Rio do Brás, em Santa Catarina, que foi de média ruim para regular, e de três corpos d'água gaúchos, o Feitoria, em dois pontos, e o Noque, que foram de média ruim para regular.

 São Paulo

São Paulo é o único estado que apresenta resultado péssimo no estudo. Em 2023, foram cinco pontos coletados em que o resultado foi abaixo de 20. Quatro amostras são referentes ao Rio Pinheiros, sendo três em São Paulo e uma Barueri. Mas o estado ainda tem amostra considerada péssima no Ribeirão dos Meninos, que fica em São Caetano do Sul.

Com o maior número de amostras coletadas , o estado também é o que tem o maior número de resultados consideradas ruins. Dos 13 pontos coletados que aparecem na pesquisa, nove estão no estado. As cidades e rios sãos os seguintes:

Ilhabela - Córrego Camarão;

Itaquaquecetuba - Rio Tietê;
Rio Grande da Serra - Afluente do Rio Pequeno;
São Paulo - Riacho do Ipiranga, Riacho Água Podre e Rio Tietê;
São Sebastião - Rio Maresias e Rio Boiçucanga;
Suzano- Rio Tietê.

Era boa, mas…

Outros locais, porém, apresentaram piora. No levantamento anterior, de 2022, o córrego do Sapateiro, em São Paulo, em sua área de nascente, tinha registrado média boa e foi para regular.

"Isso evidencia que o cuidado com o rio deve ser constante, pois, no relatório anterior, chamou atenção a melhora da qualidade da água do rio em relação ao levantamento referente a 2022, devido à colaboração entre moradores locais e prefeitura. Nenhuma ação ocorreu para a manutenção dessa melhoria, acarretando, então, o rebaixamento da média da qualidade no ano de 2023", adverte a Sosma em outro trecho do estudo.

A situação também pode ser aplicada ao córrego Balainho, em Suzano (SP). Conforme o estudo, o local também havia tido melhora em dois pontos no relatório anterior e que, agora, no levantamento mais recente, voltou a ficar com média regular.

Aumento dos locais avaliados

De acordo a fundação, o número de locais onde houve a coleta aumentou. Foram realizadas 1.101 análises, o que representa um aumento de 11,2% no total das coletas realizadas em 2022, quando foram feitas 990 análises.

Outro aumento no ano de 2023 está relacionado aos rios monitorados, de 120 para 129, com crescimento de 7,5%. Houve, ainda, aumento de 8,1% nos municípios participantes, de 74 para 80.

A instituição fala em retomada do Observando os Rios para números antes da pandemia de Covid-19. Atualmente, a rede de monitoramento da qualidade da água do Programa Observando os Rios reúne 2.700 voluntárias e voluntários que trabalham para gerar os dados.

"A participação ativa da sociedade civil e a atuação em comitês de bacias hidrográficas são fundamentais para promover a qualidade da água e a gestão sustentável dos recursos hídricos. Enquanto a ONU reforça a importância da água como um bem comum global e destaca compromissos para políticas integradas até 2030, o Brasil enfrenta a necessidade urgente de aprimorar suas políticas públicas e práticas para garantir um futuro sustentável e seguro para todas as pessoas", afirma Malu Ribeiro, diretora de políticas públicas da SOS Mata Atlântica.

Índice de Qualidade da Água

Os parâmetros do Índice de Qualidade da Água (IQA), de acordo com a Sosma, foram escolhidos por especialistas e técnicos para avaliação das águas doces brutas destinadas ao abastecimento público e aos chamados usos múltiplos. Assim, o trabalho está em uma escala que varia entre:

Ótima: acima de 40,1;
Boa: entre 35,1 e 40;
Regular: entre 26,1 e 35;
Ruim: entre 20,1 e 26;
Péssima: abaixo de 20.

O índice é usado no Brasil desde 1974 por instituições como a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). O IQA brasileiro é uma adaptação do índice desenvolvido pela National Sanitation Foundation, dos Estados Unidos. Ele é obtido por meio da soma de parâmetros físicos, químicos e biológicos encontrados nas amostras de água.

Metodologia

Para definir se a água é péssima, ruim, regular, boa ou ótima, os pesquisadores avaliaram indicadores físicos, químicos e biológicos. São os seguintes:

Temperatura da água;
Temperatura do ambiente,
Turbidez;
Espumas;
Lixo flutuante;
Odor;
Material sedimentável;
Peixes;
Larvas e vermes vermelhos;
Larvas e vermes escuros e transparentes;
Coliformes totais e fecais (termotolerantes);
Oxigênio dissolvido (OD);
Demanda bioquímica de oxigênio (DBO);
Potencial hidrogeniônico (pH);
Fosfato (PO4 ) e
Nitrato (NO3 ).

Histórico

 O histórico do IQA, disponível desde 2016, traz a evolução dos números e aponta, por exemplo, que, em 2021, houve o melhor resultado de água boa entre os locais analisados, com o índice de 10%. O pior resultado é de 2017, quando apenas 2,5% das análises foram consideradas boas.

Também em 2021, o histórico aponta que foi o único ano em que nenhuma amostra foi considerada péssima. Aliás, em se tratando disso, 2023, com 2,9%, apresentou o pior número da série histórica.

Em 2016, ainda conforme os dados históricos, foi o pior resultado quando se trata de análises consideradas ruins. Quase 34% das coletas estavam nessas condições.

Desmatamento e área remanescente

O bioma Mata Atlântica abrange uma área equivalente a 1.315.460 km², onde vivem aproximadamente 70% da população do Brasil, ao longo de 17 estados do Brasil.

No estudo, a Sosma lembra que os números do novo boletim do Sistema de Alertas de Desmatamento (SAD) Mata Atlântica, abrangendo os oito primeiros meses de 2023, reforçaram a tendência de redução significativa no desflorestamento do bioma já observada desde o início do ano.

Porém, os dados levantados apontam aumento do desmatamento nas fronteiras com o Cerrado e a Caatinga. Atualmente, restam apenas 8,5% de remanescentes florestais acima de 100 hectares de sua área original. Somados todos os fragmentos de floresta nativa madura acima de três hectares, o Brasil conta atualmente com apenas 12,4% da Mata Atlântica.

 G1