Com a greve dos caminhoneiros, denúncias de que postos de combustíveis estariam "se aproveitando da situação para cobrar preços abusivos" já foram registradas em ao menos 23 Estados e no Distrito Federal - motivando, em alguns casos, pedidos de explicação, interdição e a aplicação de multas milionárias aos estabelecimentos.
Só na Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), 693 denúncias chegaram entre a quinta-feira passada, quando o trabalho de atendimento aos consumidores e a fiscalização foram reforçados, até o início da tarde de ontem. O levantamento foi divulgado a pedido da BBC Brasil.
São Paulo concentra mais da metade das queixas, com 365, ou 52,66%.
Apenas no Procon paulista, as reclamações desde que a greve começou já passam de 2,5 mil. "Em cerca de 700 delas já comprovamos o abuso em visitas aos postos ou através de documentação, como notas fiscais, apresentadas pelos consumidores", diz o diretor de fiscalização do Procon-SP, Osmário Vasconcelos.
Gasolina a R$ 9,99 - mais que o dobro do que a ANP registrava no Estado como valor máximo na semana pré-greve - e etanol a R$ 6 por litro estão entre as denúncias.
"Esse preço do etanol é o triplo de antes e confirmamos (a cobrança), por volta do meio-dia, durante fiscalização", afirma.
Postos flagrados cometendo irregularidades, segundo ele, são notificados, recebem prazo para defesa e podem ser multados com valores que vão de R$ 800 até R$ 10 milhões caso não ofereçam justificativas plausíveis.
Na semana passada, a gasolina chegou a R$ 8,99 em um posto de Pernambuco que acabou interditado e multado em R$ 500 mil pelo Procon do estado.
Aposta no medo
"O que vivemos neste momento é uma prática abusiva por parte dos donos de postos", diz o diretor do Programa de Orientação e Proteção ao Consumidor do Procon-SP, Paulo Miguel.
"O aumento repentino no preço, nessa situação de desabastecimento gerada pela paralisação nos transportes desse produto, é abusivo e ilegal", acrescenta ele, afirmando que "os estabelecimentos estão se aproveitando do momento de greve e do pânico gerado pelo desabastecimento para aumentar o preço".
Procurada pela BBC Brasil, a Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes (Fecombustíveis), que representa os sindicatos patronais e os interesses de cerca de 40 mil postos revendedores de combustíveis no país, disse repudiar a prática de preços abusivos nas vendas e "que esse tipo de comportamento é adotado por uma parcela mínima dos estabelecimentos".
"No contexto da atual crise de abastecimento, provocada pela greve dos caminhoneiros, parcela mínima de postos revendedores - que certamente não representam a categoria - adotaram um comportamento oportunista e aumentaram extraordinariamente seus preços valendo-se da escassez do produto", informava a Federação em nota publicada em seu site ainda na semana passada.
Há informações, segundo a Federação, de que alguns estabelecimentos buscaram produtos por conta própria, negociando diretamente a escolta policial, mas para atendimento a serviços essenciais.
Como denunciar
Na quinta-feira, dia 24, a Fundação Procon-SP divulgou nota esclarecendo que a "Prática Abusiva" é prevista no Código de Proteção e Defesa do Consumidor e corresponde à elevação de preços de produtos e serviços sem justa causa.
A fim de combater essa prática, o órgão orienta o consumidor a denunciar os supostos infratores através do site.
"É fundamental que o consumidor anexe à denúncia imagem do cupom fiscal ou, na falta dele, o máximo de informações sobre o estabelecimento nome/bandeira, endereço, data de compra e preços praticados - se possível, com fotos", acrescenta.
A partir desses dados é aberto procedimento para a apuração, comprovação e possível punição dos infratores.
"Chamo a atenção para a importância da denúncia do consumidor: com a equipe que o Procon tem, não há condição de irmos em todas as cidades de cada estado. Precisamos da denúncia para agir de maneira mais certeira", explica Miguel, diretor do órgão.
Para denunciar, o consumidor ou o cidadão que se sentiu lesado tem dois caminhos. O primeiro é guardar a nota fiscal se ele fez uma compra no local.
"A nota fiscal da compra é tão importante que, com ela, o Procon não precisa ir até o estabelecimento investigar a situação; podemos já partir para segunda parte do processo: o de notificação do estabelecimento", explica Miguel.
Além do Procon, existem, em níveis locais, cerca de 60 entidades que orientam o consumidor.
No caso dos combustíveis, existe ainda a ANP. (BBCBrasil)