Petição na internet já foi assinada por mais de 700 profissionais que consideram receber valores adequados e pedem que recursos sejam destinados para outras áreas da saúde que apresentam déficit orçamentário e precisam de mais atenção
Centenas de médicos de Quebec (Canadá) estão protestando contra os aumentos de salário, dizendo que já ganham muito dinheiro. A partir da última quarta-feira (7) à tarde, mais de 700 médicos, moradores e estudantes de medicina da província canadense haviam assinado uma petição on-line pedindo que seus aumentos salários fossem cancelados. Um grupo chamado Médecins Québécois Pour le Régime Public (MQRP), que representa médicos e advogados do Quebec para saúde pública, iniciou a petição em 25 de fevereiro.
"Nós, médicos de Quebec que acreditam em um sistema público forte, nos opomos ao recente aumento de salário negociado por nossas federações médicas", diz o texto, em francês.
O grupo diz ainda que não poderia, em sã consciência, aceitar a elevação nos pagamentos enquanto as condições de trabalho continuarem difíceis para outros profissionais da área - incluindo enfermeiras e funcionários administrativos - e também enquanto pacientes "convivem com a falta de acesso aos serviços básicos em razão dos cortes drásticos dos últimos anos".
Nos últimos meses, um sindicato de enfermeiras de Quebec tem pressionado o governo a resolver a falta de profissionais nos hospitais, além de fazer lobby pela aprovação de uma lei para reduzir a quantidade de pacientes que cada profissional pode se responsabilizar.
O sindicato diz que seus membros estão cada vez mais sobrecarregados, o que resultou em uma série de protestos nos últimos meses para pressionar por melhores condições de trabalho.
Em janeiro, a situação foi retratada por uma postagem que viralizou no Facebook após a enfermeira de Quebec Émilie Ricard publicar uma foto sua, com os olhos marejados, depois do que descreveu como um turno noturno exaustivo.
Émilie afirmou que como era a única enfermeira em seu andar, teve que cuidar de mais de 70 pacientes. Além disso, o trabalho a deixou tão estressada que ela teve cãibras que a impediam de dormir. "Este é o retrato de (ser) enfermeira", escreveu a profissional, criticando o ministro de Saúde de Quebec, Gaétan Barrette, que alega que a reforma do sistema de saúde é um sucesso.
"Não sei onde você está obtendo suas informações, mas não é na realidade da enfermagem", escreveu Emilie. "Estou devastada pela minha profissão, estou envergonhada pela pobreza do atendimento que forneci, ainda que dentro do possível. Meu sistema de saúde está doente e morrendo."
A publicação de Émilie foi compartilhada mais de 55 mil vezes e teve mais de 22 mil curtidas.
"Sempre há dinheiro para os médicos, mas e para os outros (profissionais) que cuidam dos pacientes", questiona Nancy Bédard, presidente do sindicato das enfermeiras de Quebec, em declarações ao Global News.
Apesar das críticas, a federação de médicos especialistas de Quebec chegou a um acordo com o governo em fevereiro para aumentar os salários dos 10 mil médicos especialistas da província em 1,4%, elevando os custos dos atuais US$ 4,7 bilhões para US$ 5,4 bilhões em 2023, segundo a Canadian Broadcasting Corp (CBC).
Hoje, o salário médio de um médico especialista em Quebec já é alto - em média, US$ 403.537 ao ano - quando comparado com a província vizinha de Ontário - média de 367.154 ao ano -, segundo dados da CBC.
"A única coisa que parece estar imune aos cortes (do sistema de saúde) é o nosso salário", diz a petição do MQRP. "Ao contrário das declarações do primeiro-ministro (de Quebec, Philippe Couillard), acreditamos que é possível redistribuir os recursos para o sistema de saúde de Quebec para melhorar a saúde da população e cumprir com as necessidades dos pacientes sem colocar os profissionais nos seus limites."
Ainda não está claro se o movimento conseguirá impedir o aumento dos salários. Barrette, o ministro da saúde, comentou a questão pouco depois de a petição ser criada. "Se eles acham que recebem muito, podem deixar o dinheiro sobre a mesa", afirmou em entrevista à CBC em fevereiro. "Garanto que farei bom uso dele."
O ministro também disse que a situação a qual alguns trabalhadores de saúde são submetidos, como as enfermeiras, é algo que "tem que receber atenção total do governo", segundo o Toronto Star.
"Temos o dinheiro para resolver esta situação", afirmou Barrette ao jornal. "Isso não significa que temos uma quantidade infinita de dinheiro, mas temos a capacidade de resolver esta questão definitivamente." / THE WASHINGTON POST