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O papa Francisco pediu diálogo na Nicarágua depois que novos confrontos entre manifestantes e forças de ordem deixaram mais sete mortos nas últimas 24 horas, em uma série de protestos iniciada em 18 de abril.

A Igreja tem tentado mediar a crescente crise no país centro-americano, mas cancelou as negociações de paz com o governo do presidente Daniel Ortega na semana passada, depois que a repressão a protesto liderado pelas mães de vítimas resultou em pelo menos 16 mortos.

A violência voltou a assustar no sábado, quando manifestantes dispararam morteiros caseiros para defender-se da repressão policial na cidade de Masaya, perto da capital, Manágua.

Os novos distúrbios deixaram ao menos sete mortos, incluindo um cidadão americano que, segundo informes, foi assassinado por um grupo de simpatizantes do governo em um incidente separado em Manágua.

"Eu me uno a meus irmãos bispos da Nicarágua e a sua dor pelas violências cometidas por grupos armados", afirmou o Papa na oração do Angelus na praça de São Pedro, no Vaticano.

"A Igreja continua sendo favorável ao diálogo, mas para isso pede o compromisso efetivo de respeitar a liberdade e, antes que mais nada, a vida", afirmou o sumo pontífice.

"Rezo para que cessem todas as violências, para que se reúnam novamente as condições para o diálogo", disse ainda.

O governo de Daniel Ortega, em uma mensagem de condolências pela muerte do cardeal Miguel Obando neste domingo, respondeu ao chamado do papa, afirmando a "absoluta disposição de continuar trabalhando pelo diálogo, pela justiça, pela democracia" da Nicarágua.

Paralelamente, organismos da sociedade civil denunciaram neste domingo na sede da OEA em Washington a violação de direitos humanos do governo de Ortega.

Fontes diplomáticas disseram à AFP que o caso da Nicarágua, como o da Venezuela, poderá motivar uma resolução na assembleia da organização regional.

- A Igreja em fogo cruzado -
A Conferência Episcopal da Nicarágua cancelou sua tentativa de mediar o conflito após a dura repressão da manifestação de quarta-feira passada, alegando que o diálogo era impossível enquanto "o povo continuar sendo reprimido e assassinado" por "grupos próximos ao governo".

A Igreja Católica se viu cada vez mais envolvida no conflito.

No sábado, Silvio José Báez, bispo auxiliar de Manágua, advertiu os residentes de Masaya que permanecessem em casa após notícias de que franco-atiradores pró-governo disparavam contra pessoas na rua.

Uma igreja no centro de Masaya abriu suas portas para oferecer refúgio e atenção médica a 21 moradores que haviam sido detidos e, segundo informes, sofrido maus tratos pela polícia.

A ONG Associação Nicaraguense de Proteção a Direitos Humanos (ANPDH), que ajudou a obter sua libertação, disse que apresentaria uma denúncia sobre o caso ante as autoridades em Manágua.

- Morte de um cardeal emérito -

Ortega, o homem que tem dominado a política nicaraguense nas últimas quatro décadas, tem sido visto recentemente como próximo da Igreja.

Um de seus aliados-chave, o cardeal emérito Miguel Obando, morreu neste domingo aos 92 anos, anunciou a Igreja.

Obando e Ortega tinham uma relação de amor e ódio que se remonta à década de 1970.

Assim como o presidente, Obando foi um forte crítico do ditador Anastasio Somoza, derrotado pela guerrilha sandinista de Ortega em 1979.

Mais tarde se voltou contra a recém-instalada junta sandinista, liderada por Ortega, criticando sua ideologia comunista, supostas violações de direitos humanos e a visão de uma "igreja popular" baseada na teologia da libertação esquerdista.

Ortega - que perdeu a presidência nas eleições de 1990 e traçou seu eventual regresso ao poder em 2007 - recuperou simpatia do cardeal com uma combinação de políticas sociais e o apoio para uma proibição total do aborto.

Obando inclusive realizou o casamento de Ortega com sua mulher e atual vice-presidenta, Rosario Murillo, em 2005. Mas a Igreja Católica tem se distanciado do governo de Ortega desde o começo da violenta repressão dos protestos, em 18 de abril.

A igreja em Masaya protegeu os partidários da oposição dos ataques da policia antidistúrbios e dos paramilitares pró-governo. Seus sinos são usados pelos moradores para convocar voluntários para lutar contra as forças de Ortega com morteiros caseiros e pedras.

A cidade de 100 mil pessoas que já foi reduto sandinistas parecia uma zona de guerra neste domingo.

Os moradores levantaram barricadas para manter a distância da polícia antidistúrbios e se proteger do que dizem ser franco-atiradores policiais e paramilitares localizados perto de um bairro central,

Entre as cinco pessoas que morreram neste sábado na cidade está um jovem de 15 anos, segundo a ANPDH.

"O derramamento de sangue em Masaya deixou um dia de luto e dor para os cidadãos que quiseram exercer seu direito de protestar", disse o presidente da ANPDH, Álvaro Leiva.

Ortega, que deve exercer seu terceiro mandato consecutivo até o final de 2022, nega que suas forças estejam matando os manifestantes. Seu governo acusa "grupos de direita" de conspirar para "aterrorizar" o país. (AFP)