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Os casos de feminicídio aumentaram 44% no 1º semestre de 2019 no estado de São Paulo se comparados ao mesmo período do ano anterior, de acordo com levantamento feito pelo G1 e pela GloboNews. Nos primeiros seis meses deste ano, 82 mulheres foram vítimas de feminicídio. Em 2018, foram 57 casos.

Nesta quarta-feira (7), a Lei Maria da Penha, que criminalizou a violência contra a mulher, completa 13 anos.

A maioria dos casos, 73%, ocorreu dentro de casa: 60 de 82. Em 46% dos casos, o suspeito foi preso em flagrante. A média de idade de todas as vítimas mortas em 2019 é de 36 anos. A reportagem analisou as idades de 75 das 82 vítimas mortas neste ano. As informações das outras sete vítimas não constam nos boletins de ocorrência.

Segundo a Secretaria da Segurança Pública, do total de casos registrados no período, "68 deles foram esclarecidos e seus autores presos em flagrante ou no curso das investigações. Outros oito feminicidas morreram após as ocorrências”.

Desde 9 de março de 2015, a legislação prevê penalidades mais graves para homicídios que se encaixam na definição de feminicídio – ou seja, que envolvam "violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher". Os casos mais comuns desses assassinatos ocorrem por motivos como a separação.

Em junho deste ano, ocorreram 10 casos contra 6 no mesmo mês de 2018, aumento de 67%. Foi no 1º semestre deste ano que a polícia paulista registrou o primeiro caso de feminicídio de uma vítima transexual, como o G1 e a GloboNews revelaram em maio.

Na contramão dos feminicídios, os demais crimes violentos reduziram no mesmo período. O estado de São Paulo registrou queda no número de casos de latrocínios, roubos, estupros e homicídios no primeiro semestre de 2019 em comparação com o mesmo período de 2018.

Segundo dados divulgados no último dia 25 pela Secretaria de Segurança Pública (SSP), o estado termina o primeiro semestre com o menor número de casos e vítimas de homicídios dolosos e latrocínios registrados para o período na série histórica.

Para a diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno, há aumento real dos casos de feminicídio.

"Eu não acho que a notificação esteja aumentando, consideramos isso como hipótese por muito tempo. Acho que há um processo de acomodação. Como a maior parte desses casos é decorrente de uma relação entre casal, o chamado 'feminicídio íntimo', a polícia já vinha classificando de maneira adequada há algum tempo. Então, acho que estamos falando de aumento real da violência de gênero", diz.

Traçando hipóteses para entender por qual motivo as mulheres estão morrendo em proporção maior, Samira vê como possibilidade o maior alcance de um discurso que incentiva a violência como forma de resolução de conflito. "É possível ver aumento de crimes como linchamento, violência policial e violência de gênero", diz.

O número de pessoas mortas por policiais militares também aumentou no primeiro semestre no estado: 4,28%. Ao todo, 414 pessoas foram mortas pela PM entre janeiro e junho de 2019, enquanto 397 foram mortas no mesmo período de 2018.

Outro fator importante para Samira é que a maioria das vítimas de feminicídio não tinham medidas protetivas ou boletins de ocorrência registrados.

"Precisamos encorajar essa mulher vítima de violência a denunciar. Os instrumentos não podem ser acionados sem as vítimas. A rede de acolhimento também precisa estar fortalecida. A entrada delas só vai acontecer por meio da assistência social, Saúde, que precisariam funcionar minimamente para fazer com que essa mulher procure a delegacia para denunciar. Se a rede não estiver funcionando, ela dificilmente vai chegar na delegacia ou acionar 190", disse.

A SSP, por meio de nota, informou que "para combater a violência contra a mulher e reduzir a subnotificação desses crimes, o governo do estado ampliou de uma para 10 as delegacias de Defesa da Mulher 24 horas em todo o estado".

"Outras 30 unidades também terão atendimento ininterrupto até 2022. Também implementou o SOS Mulher, aplicativo que prioriza o atendimento às pessoas com medidas protetivas, deslocando as equipes policiais mais próximas do local da ocorrência, e lançou uma campanha para conscientizar a população sobre o combate à violência doméstica, inclusive estimulando a denúncia dos agressores", diz o texto.

Casos

Um dos casos de feminicídio íntimo desse semestre ocorreu em Guarulhos, na Grande São Paulo, quando um homem matou a mulher a facadas após uma discussão. De acordo com a polícia, Wladimir Oliveira da Silva, de 51 anos, estava em um bar por volta das 21h, quando decidiu voltar para a casa. Na residência, o homem brigou com a esposa Valdikelle Maria Silva, de 31 anos, e depois a esfaqueou.

Segundo os policiais, três crianças estavam dentro da casa na hora do crime, mas a polícia não confirma se são filhos do casal. Após esfaquear a esposa, o homem tentou se matar, também com golpes de faca. Ele foi levado para o Hospital Geral de Guarulhos.

Justiça

A Justiça aceitou denúncia e tornou réu sob a acusação de feminicídio Pablo Danilo dos Santos Damásio, 22 anos. Ele é apontado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público Estadual como autor do assassinato da garota de programa Viviane Miranda Maurício, 24 anos. O crime ocorreu dentro de um apartamento em Mauá, no ABC paulista, no dia 24 de abril deste ano.

Damásio, que fugiu após cometer o crime, foi preso em flagrante durante uma tentativa de roubo, na cidade de Paraty, no litoral fluminense, no dia 14 de maio. Até o momento da publicação desta reportagem, ele não tinha constituído advogado para defendê-lo dessa acusação.

Na denúncia, o Ministério Público sustenta que Damásio matou Viviane após se negar a pagar o valor acertado para o programa com a vítima.

Em um trecho da denúncia, o promotor de Justiça Flávio Leão de Carvalho afirma que “razões da condição do sexo feminino restaram comprovadas, vez que Pablo claramente menosprezou a vida da vítima pelo só fato de ser ela garota de programa”.

Ao defender a manutenção da prisão preventiva do suspeito, ou seja, sem prazo definido para a sua libertação, o promotor declarou que “o denunciado possui histórico de violência doméstica contra sua companheira ora testemunha, Camille, podendo ele, em liberdade, coagi-la a prestar depoimento em seu favor”. (G1)