Mamãe Noel em São José do Rio Preto (SP), mulher se emociona ao receber cartinha de criança com pedido de caderno e recado cordial que informa que, caso o desejo não seja atendido, não haverá problema. Há cerca de 20 anos desenvolvendo um trabalho comunitário, ela lembra que já teve acesso a pedidos de “cortar o coração”.

Raquel Barbosa dos Santos, de 57 anos, é conhecida como “Tia Raquel” entre as crianças. Em 2004, após receber em casa uma cartinha endereçada ao Papai Noel, que chegou por engano, a Mamãe Noel decidiu iniciar o projeto, que consiste em arrecadar cartinhas e buscar pessoas que aceitem “adotá-las” atendendo aos pedidos.

A simplicidade dos desejos é o que mais chama atenção dela. Entre as cartinhas recebidas, algumas crianças pedem brinquedos e itens de necessidade básica, como alimentos e roupas. Este ano, um dos pedidos foi um livro de colorir, em que a criança deixou recado especial: “Se não conseguir, não tem problema”, constava na carta.

Em outra, mais um desejo comovente: “Meu sonho é ter uma bicicleta e uma roupa para passar o Natal. Também quero pedir uma cesta básica para a minha mamãe”, escreveu a criança.

 

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 Ao longo de duas décadas, Raquel guarda na memória algumas histórias que a emocionaram profundamente. Uma delas aconteceu há cerca de 13 anos, quando uma criança pediu o pai de volta, que à época estava preso.

"Aquilo mexeu comigo. Não era algo que eu pudesse resolver", relembra a Mamãe Noel.
Este ano, das mais de 300 cartinhas recebidas, ainda faltam cerca de 40 para serem adotadas. Quem quiser ajudar, pode entrar em contato pelo telefone (17) 98814-8857.

Corrente do bem
Transformar esses pedidos em realidade só é possível com a ajuda de dezenas de voluntários. Pessoas como a agente de endemias Eliane Cristina Ribeiro de Andrade, que adota as cartinhas desde 2015, estão entre as que não hesitam em estender a mão. Este ano, ela atendeu a quatro pedidos, entre eles, roupas temáticas do "Homem de Ferro" e brinquedos como carrinhos, arco e flecha.

“Uma vez, uma criança pediu um chinelo. Foi o pedido que mais me marcou. É impossível descrever a alegria de participar disso”, conta Eliane.

Para ela, o projeto ganhou um significado ainda maior em 2018, quando perdeu a filha.

“Participar das entregas me trouxe um conforto enorme. Sempre digo que a Raquel não é um ser humano deste mundo.”

Antes de fazer a entrega, Raquel organiza os presentes com cuidado - cada um é identificado com o nome da criança. Em seguida, ela distribui de porta em porta e promove uma festa comunitária no bairro São Pedro, com direito a refrigerante e cachorro quente, além da chegada do Papai Noel. Durante o evento, alguns dos presentes também são entregues.

 Inspiração

O projeto de "Tia Raquel" começou de forma inesperada em 2004, quando uma cartinha endereçada ao Papai Noel chegou por engano na casa dela. À época, o marido estava desempregado, e o casal tinha três filhos pequenos para sustentar.

Apesar das dificuldades, a Mamãe Noel decidiu atender ao pedido. Desde então, nunca mais parou... Pouco tempo depois, resolveu iniciar o projeto com a arrecadação das cartinhas.

“No primeiro ano, foram só 32 cartinhas. Tudo muito pequeno, improvisado. Hoje, já perdi as contas de quantas foram nesses 20 anos”, conta.

Atuando como empregada doméstica, Raquel comanda a iniciativa de forma totalmente independente, sem patrocinadores ou grandes divulgações. Inicialmente, as cartinhas são deixadas na casa dela. Entre amigos, moradores do bairro onde reside e seguidores nas redes sociais, a Mamãe Noel busca "padrinhos" para as crianças.

“Não faço nada sozinha. Tenho pessoas incríveis que me ajudam, mas é tudo no ‘boca a boca’”, explica.
Além de trazer esperança e alento aos mais necessitados, a dedicação de Raquel inspira outras pessoas. Entre a diversidade de pedidos, o projeto se tornou símbolo de solidariedade e união entre a comunidade.

G1