"Ela nunca foi um bom exemplo, mas era gente boa". Rita Lee decidiu finalizar com esta frase o capítulo "profecia" em seu primeiro livro autobiográfico, publicado em novembro de 2016. Em nove linhas, ela brinca e imagina sobre como seria a repercussão e a reação das pessoas diante de sua morte (veja abaixo).

Rita imaginou que os fãs "empunharão capas dos seus discos e entoarão "Ovelha Negra". Esse movimento já começou, mas não como ela esperava. Diversas pessoas publicaram nas redes sociais trechos da música desde que a sua morte foi anunciada.

 

"Foi quando meu pai me disse filha. Você é a ovelha negra da família. Agora é hora de você assumir"

E quanto às redes, a roqueira escreveu que algumas pessoas publicariam "ué, pensei que a véia já tivesse morrido, kkk". Mas a verdade é que muitas pessoas lamentaram sua morte, tanto que seu nome entrou nos trends (palavras mais publicadas) do Twitter.

Uma das maiores cantoras e compositoras da história da música brasileira morreu na segunda-feira (8), aos 75 anos. Ela foi diagnosticada com câncer de pulmão em 2021 e vinha fazendo tratamentos contra a doença.

A obra de 296 páginas - que levou Rita Lee a concorrer ao Prêmio Jabuti de 2017 - conta sobre como ela enxergou a vida desde que começou a cantar e quais sentimentos ficaram desde aquela época. O livro passa pela infância, os primeiros passos na vida artística, prisão, o relacionamento com Roberto de Carvalho, até a idade mais avançada - imaginando, ao fim, como seriam os minutos após sua morte.

"Quando eu morrer, posso imaginar as palavras de carinho de quem me detesta. Algumas rádios tocarão minhas músicas sem cobrar jabá, colegas dirão que farei falta no mundo da música, quem sabe até deem meu nome para uma rua sem saída", imaginou Rita Lee em sua profecia.
O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, usou suas redes sociais para dizer que cumprirá o que Rita pediu, mas ao invés de colocar em uma rua sem saída, seu nome será dado a uma praça - o local ainda não foi definido. A cantora expressou o desejo de ter uma praça em seu nome durante uma entrevista à apresentadora Fernanda Young, no “Irritando Fernanda Young”, do canal GNT, exibido em 2008.

Ao longo das nove linhas que escreveu sobre sua morte, Rita Lee aproveitou para advertir os políticos. "Nenhum político se atreverá a comparecer ao meu velório, uma vez que nunca compareci ao palanque de nenhum deles e me levantaria do caixão para vaiá-los".

O velório da cantora será aberto ao público, no Planetário do Parque Ibirapuera, nesta quarta-feira (10), das 10h às 17h.

Por fim, no livro, Rita imaginou como estaria agora, após morrer: "Eu de alma presente no céu tocando minha autoharp e cantando para Deus: 'Thank You Lord. Finally Sedated'".

Novo livro

Rita Lee havia anunciado, em 7 de março, o lançamento de mais um livro sobre sua história. "Outra Autobiografia" - fazendo referência ao "Rita Lee: Uma autobiografia" (2016). A publicação já está em pré-venda e chega ao mercado em 22 de maio. A data foi escolhida por ser o dia de santa Rita de Cássia.

"(...) quando decidi escrever Rita Lee: Uma autobiografia (2016), o livro marcava, de certo modo, uma despedida da persona ritalee, aquela dos palcos, uma vez que tinha me aposentado dos shows. Achei que nada mais tão digno de nota pudesse acontecer em minha vidinha besta. Mas é aquela velha história: enquanto a gente faz planos e acha que sabe de alguma coisa, Deus dá uma risadinha sarcástica", escreveu a cantora ao anunciar a novidade.

O começo na música
Rita Lee Jones nasceu em São Paulo, em 31 de dezembro de 1947. O pai, Charles Jones, era dentista e filho de imigrantes dos Estados Unidos. A mãe, a italiana Romilda Padula, era pianista, e incentivou a filha a estudar o instrumento e a cantar com as irmãs.

Aos 16 anos, Rita integrou um trio vocal feminino, as Teenage Singers, e fez apresentações amadoras em festas de escolas. O cantor e produtor Tony Campello descobriu as cantoras e as chamou para participar de gravações como backing vocals.

Em 1964 ela entrou em um grupo de rock chamado Six Sided Rockers que, depois de algumas mudanças de formações e de nomes, deu origem aos Mutantes em 1966. O grupo foi formado inicialmente por Rita, Arnaldo Baptista e Sérgio Dias.

Eles foram fundamentais no tropicalismo, ao unir a psicodelia aos ritmos locais, e se tornaram o grupo brasileiro com maior reconhecimento entre músicos de rock do mundo, idolatrados por Kurt Cobain, David Byrne, Jack White, Beck e outros.

O trio acompanhou Gilberto Gil em “Domingo no parque” no 3º Festival de Música Popular Brasileira da Record, em 1967, e Caetano Veloso em “É proibido proibir” no 3º Festival Internacional da Canção, da Globo em 1968, dois marcos da tropicália.

Os Mutantes também participaram do álbum “Tropicália ou Panis et Circensis”, de 1968, a gravação fundamental do movimento.

Rita fez parte do grupode 1966 a 1972. Gravou “Os Mutantes” (68), “Mutantes” (69), “A Divina Comédia ou Ando Meio Desligado” (70), “Jardim Elétrico” (71) e “Mutantes e Seus Cometas no País dos Bauretz” (72).

Carreira solo promissora
O fim do relacionamento com Arnaldo Baptista coincidiu com a saída dela dos Mutantes. O primeiro álbum solo foi “Build up”, ainda antes de deixar a banda, em 1970. Ela também lançou “Hoje é o Primeiro Dia do Resto da Sua Vida”, em 1972, ainda gravado com o grupo.

A carreira pós-Mutantes tomou forma com o grupo Tutti Frutti. Com essa banda, ela gravou cinco álbuns, incluindo “Fruto proibido”, de 1975, que tinha a música “Agora só falta você”.

A partir de 1979, ela começou a trabalhar em parceria com o marido Roberto de Carvalho, e se firmou de vez na carreira solo. Juntos, eles escreveram e gravaram canções de pop rock e baladas românticas com grande sucesso.

Foto de Rita Lee junto de Roberto de Carvalho no programa de televisão "Altas Horas"
Um dos álbuns mais bem-sucedidos foi “Rita Lee”, de 1979, com “Mania de Você”, “Chega mais” e “Doce Vampiro”. No disco de mesmo título do ano seguinte, ela seguiu na direção mais pop e fez ainda mais sucesso com “Lança perfume” e “Baila comigo”.

Ela era uma roqueira popular antes e depois de o gênero se tornar um fenômeno comercial no Brasil em meados dos anos 80.

Entre os álbuns de destaque, estiveram “Saúde” (1981) e “Rita e Roberto” (1985), com o qual os dois subiram ao palco do primeiro Rock in Rio